Existe porneia “dentro do casamento”? |
A definição e as referências de palavras gregas só podem ser feitas por um estudo dos contextos no NT onde essas palavras ocorrem. Em 1972, a definição de porneia era infidelidade conjugal. Em 1973, as ações homossexuais foram incluídas. Além das duas referências mencionadas, as relações sexuais entre pessoas não casadas são incluídas em porneia no NT. Apesar do fato de que o NT não tem nenhuma definição ou especificação das diferentes maneiras sobre como porneia pode ser realizada, o CG em 1974 fez suas próprias definições de porneia. E não apenas isso, mas eles aplicaram essas definições aos casamentos das TJs. Os membros do CG assumiram a responsabilidade de decidir como as relações sexuais entre pessoas casadas deveriam ser realizadas, e o que eles chamaram de ações “lascivas” entre pessoas casadas foram incluídas no conceito de porneia. Isso criou grandes problemas: Maridos foram desassociados por causa de suas relações sexuais “lascivas” com as esposas, casamentos foram dissolvidos e os filhos sofreram. Depois de três anos, a visão de porneia “dentro do casamento” foi abandonada. Mas danos irreversíveis já haviam sido causados. Os membros da CG evidentemente não aprenderam nada com seus erros, pois passaram a fazer novas definições de porneia que não são baseadas na Bíblia. Em 1986, as relações sexuais com um animal foram incluídas no significado de porneia. Em 1999, acariciar deliberadamente os órgãos sexuais de outra pessoa também foi incluído, e em 2019 foi afirmado que a porneia poderia ser realizada estando totalmente vestido e sem contato pele com pele. Em conexão com porneia, o CG ‘jogou (as Testemunhas) como que por ondas e as levou para cá e para lá por todo vento de ensino”. (Efésios 4:14). E por causa da exigência de obediência absoluta, as Testemunhas devem aceitar qualquer coisa que o CG decidir. |
As doutrinas ensinadas pelas Testemunhas de Jeová são, em grande medida, semelhantes às doutrinas ensinadas por C.T. Russell, e o livro The Harp Of God, escrito por C.F. Rutherford, quase poderia ser usado como um livro de estudo para pessoas interessadas hoje.
Existem, é claro, algumas diferenças entre as doutrinas atuais de Testemunhas de Jeová e as doutrinas encontradas nos sete volumes de Studies in the Scriptures (Estudos das Escrituras) de C.T. Russel. A razão para uma das mudanças de ponto de vista é a melhor compreensão da palavra mnemeion (“túmulos memoriais”), com base em manuscritos gregos descobertos. Todos os mortos em mnemeion serão ressuscitados. Mas quando entendemos que nem todas as pessoas mortas estão em mnemeion, percebemos que nem todas as pessoas que viveram na terra serão ressuscitadas, que era a visão de C.T. Russel.
Na literatura da Torre de Vigia de 1970 até o presente, a definição da palavra grega porneia mudou. A razão para isso, não é a descoberta de novos manuscritos gregos, mas sim a incompetência dos membros do CG em relação ao seu entendimento e tratamento desta palavra grega. Em 1972, o entendimento da porneia como motivo do divórcio limitava-se à infidelidade conjugal, ou seja, às relações sexuais entre homem ou mulher casado (a) e pessoa do sexo oposto. As ações homossexuais não estavam incluídas em porneia. Mas em 1973, o significado de porneia foi estendido para incluir o sexo homossexual.
A única maneira de entender o significado de porneia é olhar para os contextos do NT. Apenas o significado geral de “imoralidade sexual” pode ser interpretado a partir dos contextos das 25 ocorrências do substantivo porneia e das sete ocorrências do verbo porneuō. E há três referências: 1) à infidelidade marital (Mateus 5:32), 2) às relações sexuais entre pessoas solteiras (1 Coríntios 7: 1, 2) e 3) às relações homossexuais (Judas 7).
1974: PORNEIA DENTRO DO CASAMENTO É INSTITUÍDA
Em 1974, ocorreu uma revolução na visão do significado de porneia: pessoas casadas poderiam ser culpadas de porneia por suas relações sexuais com seus companheiros dentro do casamento. Apesar do fato de porneia no NT ser um termo geral com apenas as três referências mencionadas acima, e nenhuma ação sexual particular estar conectada a porneia no NT, o CG agora afirmava que ações sexuais particulares por pessoas casadas constituiam porneia. A Sentinela de 15 de novembro de 1974, página 703,[1] diz:
Há ocasiões em que práticas lascivas dentro do arranjo marital proveriam o motivo para um divórcio bíblico. . .
De modo que a “fornicação” é apresentada como único motivo para o divórcio. No grego comum, no qual se registraram as palavras de Jesus, o termo “fornicação” é porneía, que designa todas as formas de relações sexuais imorais, perversões e práticas lascivas tais como talvez sejam praticadas num prostíbulo, inclusive o coito oral e anal.
Quanto às declarações de Jesus a respeito do divórcio, não especificam com quem é praticada a “fornicação” ou porneía. Isto deixa a questão aberta. Que porneía pode corretamente ser considerada como incluindo as perversões dentro do arranjo marital é visto em que o homem que obriga sua esposa a ter com ele relações sexuais desnaturais virtualmente a “prostitui” ou “corrompe”. Isto o torna culpado de porneía, porque o verbo grego relacionado, porneúo, significa “prostituir, corromper”.
Por isso, podem surgir circunstâncias que tornariam as práticas lascivas dum cônjuge para com o outro motivo bíblico para o divórcio.
Especificar quais ações sexuais estão incluídas em porneia é impossível do ponto de vista do NT, como já mencionado. Em nenhum lugar do NT porneia é definida ou especificada. Dizer que porneia inclui “perversões e práticas lascivas tais como talvez sejam praticadas num prostíbulo”, não tem qualquer base linguística ou bíblica. No entanto, esse qualificador definidor, referindo-se a uma casa de prostituição, tem se repetido continuamente até hoje. Dizer que porneia se refere à cópula anal e oral e outras práticas obscenas dentro de um casamento é invadir a esfera privada de cada casal.
Durante os três anos e meio, a visão de porneia “dentro do casamento” existiu, houve enormes problemas. Por exemplo, o que era uma “prática lasciva”? Se uma esposa acusasse o marido de práticas lascivas e desejasse divorciar-se dele, mas o marido não considerasse suas relações sexuais lascivas, o que aconteceria?[2] Quem deveria decidir o assunto? Os anciãos? Maridos foram desassociados por causa de suas relações sexuais com as esposas durante o casamento. Um grande número de casamentos foi dissolvido por motivos não bíblicos, e maridos, esposas e filhos sofreram. Muitos anciãos também criaram problemas porque se comportavam como policiais (veja a última cláusula na citação de A Sentinela de 1978 abaixo) e, de fato, interrogaram casais sobre suas vidas sexuais.
[1] Em português, A Sentinela de 1º de maio de 1975, p. 287. Perguntas dos Leitores.
[2] Tenho conhecimento de primeira mão de um exemplo. Isso se arrastou por vários meses, com várias conversas entre a esposa, o marido e os anciãos. Ambos ficaram deprimidos e, finalmente, se divorciaram.
1978: PORNEIA DENTRO DO CASAMENTO É ABANDONADA
Então veio a reversão. A Sentinela de 15 de fevereiro de 1978, página 31,[1] mostrou que porneia não podia ser aplicada a casais e que o sexo oral dentro do casamento, que fora considerado porneia, não podia ser incluído na palavra porneia.
No passado, publicaram-se nesta revista alguns comentários relacionados com certas práticas sexuais incomuns, tais como a copulação oral, dentro do matrimônio, e estas foram classificadas como crassa imoralidade sexual. Nesta base, chegou-se à conclusão de que aqueles que se empenhavam em tais práticas sexuais estavam sujeitos a serem desassociados, se fossem impenitentes. Adotava-se o conceito de que estava dentro da autoridade dos anciãos congregacionais investigarem e agirem na qualidade judicativa com respeito a tais práticas na relação conjugal.
Um cuidadoso exame adicional deste assunto, porém, convence-nos de que, em vista da ausência de claras instruções bíblicas, trata-se de assuntos pelos quais o casal tem de levar a responsabilidade perante Deus, e que essas intimidades maritais não são da competência dos anciãos congregacionais, para tentar controlá-las ou promover a desassociação, tendo tais assuntos por base exclusiva. [Uma nota de rodapé mostra que Romanos 1: 24-27 se refere apenas a homossexuais e não pode ser usado em conexão com casais.] Naturalmente, caso alguém decida chegar-se a um ancião em busca de conselho, ele ou ela pode fazer isso, e o ancião poderá considerar princípios bíblicos com tal pessoa, atuando como pastor, mas sem tentar, na realidade, “policiar” a vida marital de quem indaga. (O grifo é meu.)
É importante notar que a razão para a reversão foi “em vista da ausência de claras instruções bíblicas”. Isso significa que o CG admitiu que suas definições de porneia dentro do casamento eram mandamentos humanos sem qualquer base bíblica. Será que o CG fez alguma coisa para consertar todos os problemas que seus mandamentos humanos causaram a centenas ou milhares de irmãos? Não! O que poderia ter sido feito? Seria difícil restaurar um casamento que foi dissolvido por um motivo antibíblico. Mas as pessoas que haviam sido desassociadas por causa de mandamentos humanos podiam ser readmitidas. Porém, nenhuma tentativa foi feita.
[1] Em português, A Sentinela de 1º de agosto de 1978, p. 29. Perguntas dos Leitores.
1986-2019: NOVAS DEFINIÇÕES NÃO-BÍBLICAS DE PORNEIA
A mudança de visão sobre porneia por parte do CG é um excelente exemplo dos efeitos negativos da atual estrutura organizacional, em que o CG é um governo para as TJs. Obediência absoluta foi exigida durante os três anos e meio em que o CG disse que a porneia poderia ser realizada dentro do casamento, e obediência absoluta foi exigida quando o CG abandonou essa visão. Essa situação se encaixa muito bem nas palavras de Paulo em Efésios 4:14 (TNM2015).
Então não devemos mais ser crianças, jogados como que por ondas e levados para lá e para cá por todo vento de ensinamentos, pela esperteza (panourgia) de homens, pela astúcia (kybeia) de artimanhas enganosas.
As palavras de Paulo referem-se a falsos mestres que estavam planejando (inventando) o erro por meio de “astúcia” (kybeia) Esta palavra grega se refere a jogos de dados e jogos de azar e, metaforicamente, a palavra se refere a “astúcia”. A palavra “trapaça” inclui “astúcia” ou “traição”. Os falsos mestres a que Paulo se referiu não tinham boas intenções e tentaram persuadir todos a seguir seus ensinos.
Os membros do CG sempre tiveram boas intenções. Mas o sistema organizacional que eles criaram os colocou na mesma arena dos falsos mestres. Este sistema é baseado em dois princípios diferentes, 1) os membros do CG acreditam que têm o direito de fazer mandamentos e regulamentos que não são encontrados na Bíblia, e 2) eles exigem obediência absoluta. A reversão completa da visão de porneia “dentro do casamento” prova que eles estavam inventando um erro – embora com um bom motivo. E a exigência de que todas as Testemunhas de Jeová aceitassem sua visão de porneia “dentro do casamento” e depois aceitassem exatamente o oposto mostra que as Testemunhas de Jeová foram ‘jogadas para lá e para cá por todo vento de ensinamentos.’
Mas será que o CG aprendeu alguma coisa com seus erros em relação à porneia “dentro do casamento”? A resposta parece ser NÃO, porque durante os anos que se passaram desde o desastre de 1974-78, eles passaram a fazer novas definições de porneia não encontradas no NT. Em 1986, o sexo com um animal foi incluído em porneia. Em 1999, o significado foi estendido para incluir acariciar deliberadamente os órgãos sexuais de outra pessoa. E em 2019, a definição mais extrema foi apresentada. Se uma pessoa é íntima de outra pessoa que não seja seu cônjuge, isso pode constituir porneia mesmo quando as duas pessoas estão totalmente vestidas e não há contato pele a pele.
CONCLUSÃO
Visto que os membros do CG acreditam que foram nomeados por Deus para ser um governo para as TJs, eles também acreditam que podem fazer leis e regulamentos sem uma base bíblica clara para fazê-lo. E eles exigem obediência absoluta em relação a essas leis e regulamentos. Aqueles que não são obedientes são desassociados sob o pretexto de que estão causando divisões dentro da organização.
A lei sobre porneia “dentro do casamento” existiu por três anos e meio e causou danos irreparáveis. Maridos foram desassociados por causa de suas relações sexuais com as esposas, casamentos foram dissolvidos e os filhos sofreram. Os membros do CG perceberam que haviam ido longe demais e, portanto, a lei inventada por homens foi anulada. No entanto, os membros do CG continuaram a expressar sua visão pessoal extrema das relações sexuais. A lei mais extrema que eles fizeram é que a porneia pode ser executada mesmo se ambas as pessoas estiverem totalmente vestidas e não houver contato pele a pele. E com base nessa lei humana, o cônjuge do envolvido pode exigir o divórcio.
Por Rolf Furuli.